Após sete altas consecutivas, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu, nesta quarta-feira (30), manter a taxa básica de juros (Selic) em 15% ao ano. A decisão, que já era aguardada por analistas, interrompe uma sequência de aumentos iniciada em setembro de 2024, quando a Selic estava em 10,5%. No acumulado desde então, foram 4,5 pontos percentuais de alta — patamar que não era alcançado desde julho de 2006.
A economista-chefe da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), Ieda Vasconcelos, avalia que a pausa no ciclo de aperto monetário não representa alívio imediato para o setor. “A manutenção dos juros nesse nível ainda impõe forte restrição ao crédito e impacta diretamente a capacidade de investimento, sobretudo em um setor que depende de financiamento de longo prazo como a construção civil”, explica.
A conjuntura que levou à decisão do Copom permanece complexa. A inflação segue resistente e fora da meta. Desde janeiro, o IPCA acumula variação acima do intervalo de tolerância estabelecido pela nova sistemática de metas inflacionárias. “Já são seis meses consecutivos com o índice estourando o limite superior da meta, o que, segundo o novo marco regulatório da política monetária, configura oficialmente o descumprimento da meta pelo país”, destaca Ieda.
Além das pressões internas, o cenário internacional também pesa. A partir de 1º de agosto, o governo dos Estados Unidos deve aplicar uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros, o chamado “tarifaço”. A medida afeta diretamente a competitividade do Brasil no comércio exterior, pode provocar desvalorização do real e alimentar ainda mais a inflação — criando um ambiente de incerteza que inibe novos investimentos.
Efeitos severos no crédito imobiliário
Um dos reflexos mais visíveis dos juros elevados é a fuga da caderneta de poupança, principal fonte de financiamento do setor imobiliário. Apenas no primeiro semestre de 2025, a poupança teve captação líquida negativa de R$ 38,4 bilhões — valor superior à perda de todo o ano de 2024. Desde 2021, a perda acumulada já passa de R$ 248 bilhões.
A retração impacta diretamente os financiamentos. Dados da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) mostram que o número de unidades habitacionais financiadas com recursos da poupança caiu 14,62% no primeiro semestre de 2025, em relação ao mesmo período do ano anterior. Mais grave ainda é a situação da produção de novos imóveis: o número de unidades financiadas despencou 60,83%, caindo de 81.858 para 32.065 unidades.
“O recuo tão expressivo no crédito para a construção preocupa bastante, porque esse é o segmento responsável por iniciar novos empreendimentos e manter a roda da economia girando. Quando o crédito encolhe, os lançamentos são adiados e os impactos se espalham por toda a cadeia produtiva”, avalia Ieda.
Emprego em alta, mas projeções futuras pedem cautela
Apesar do contexto desafiador, o setor da construção continua como um dos motores do emprego formal no país. De janeiro a maio, 14,2% das novas vagas com carteira assinada vieram do setor, que ultrapassou a marca de três milhões de trabalhadores formais em maio — número que não era registrado desde o final de 2014.
Esse desempenho positivo sustenta, por ora, a expectativa de crescimento de 2,3% para a construção civil em 2025, segundo projeção mantida pela CBIC. “O resultado ainda será influenciado por obras lançadas em 2023 e 2024, mas a falta de novos investimentos compromete o desempenho futuro. O ciclo produtivo da construção é longo, e os efeitos do crédito travado se sentirão de forma mais intensa nos próximos anos”, alerta a economista.
Diante de um cenário marcado por incertezas, juros elevados e inflação persistente, a CBIC reforça a importância de medidas que promovam maior previsibilidade econômica e acesso ao crédito. “A construção é estratégica para o desenvolvimento do Brasil. É preciso criar um ambiente favorável para que o setor possa continuar gerando empregos, moradia e crescimento econômico sustentável”, conclui Ieda.
O tema tem interface com o projeto “Conhecimento, Segurança e Saúde no Trabalho na Indústria da Construção”, da Comissão de Política de Relações Trabalhistas (CPRT) da CBIC, com a correalização do Serviço Social da Indústria (Sesi).
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